Avivah Wittenberg-Cox é autora do livro Late Love: e se o melhor ainda estivesse por vir?, lançado pela norte-americana Paperback em 2018. Traduzido para o francês e ainda sem previsão de lançamento em português no Brasil, a publicação investiga uma série de casais que encontraram o amor depois dos 50 anos, ou mais tarde, já na chamada terceira idade. Entrevistada pela RFI, a autora propõe o rompimento de paradigmas e tabus sobre a possibilidade de realização pessoal e amorosa na maturidade e avisa: “o segredo é se libertar do olhar das outras pessoas”.
Aos 49 anos, Avivah Wittenberg-Cox se divorciou e recomeçou a vida ao lado de outro companheiro, uma imagem que ela gosta de usar para ilustrar a possibilidade de ser feliz no amor na maturidade. Mas o episódio da vida pessoal da autora antecipa também as estatísticas do International Longevity Center, no Reino Unido, que provam que, se o número de divórcios após os 60 anos aumentou em 85%, na Inglaterra e no País de Gales, o número de pessoas vivendo sozinhas depois dos 70 anos diminuiu significativamente, o que mostra que novos casais vêm se formando na terceira idade.
“O estilo de vida dos cinquentões [de ambos os sexos] se aproxima cada vez mais de jovens adultos de 20 anos. Geralmente, em ambas as faixas etárias não existe mais criança pequena para tomar conta, e podemos aprender, viajar”, afirma Wittenberg-Cox, consultora de gestão humana no ambiente de negócios e uma ativista reconhecida da diversidade de gênero no trabalho.
Aumento da longevidade
“O aumento da longevidade reconfigurou toda a viagem”, explica. “Hoje percebemos que, aos 50 anos, temos ainda um longo caminho pela frente, e começamos a nos perguntar como queremos viver pelas próximas três décadas, pelo menos. Percebemos que tudo não acabou, pelo contrário, está apenas (re)começando”, aponta a autora de Late Love. “É uma tendência mundial, que acontece também a partir do aumento da emancipação feminina, da participação feminina em lugares de poder”, afirma.
“É claro que esse dado varia entre países, mas também no contexto brasileiro as mulheres aumentaram sua participação no mercado de trabalho, mesmo que seja de maneira mais lenta, mas elas começaram a se emancipar. Claro que não falo de todas as mulheres, mas especialmente daquelas que trabalharam toda sua vida, que se tornaram financeiramente independentes e que tiveram um certo grau de educação. Estas mulheres começam a tomar as rédeas de sua vida pessoal, do seu corpo”, diz Wittenberg-Cox. “Aprendemos a envelhecer com qualidade quando nos libertamos do olhar da sociedade sobre nossa aparência física, é quando começamos a nos tornar nós mesmos”, completa.
Para a autora, conseguir escapar dos paradigmas sociais é fruto de um trabalho interno. “Uma das consequências do aumento da longevidade no mundo é que este vício de juventude eterna está diminuindo. As pessoas começam a apreciar o processo de envelhecimento como uma possibilidade”, acredita. “Ao contrário de seus pais, as pessoas hoje de 50 ou 60 anos possuem vitalidade, um aspecto mais jovem, mantêm o corpo em boas condições. Não é uma nova juventude, mas terminamos as atividades da primeira parte da vida adulta, e partimos mais livres para a segunda, é uma outra perspectiva”, diz a consultora.
“Curva da felicidade” volta a crescer a partir de 45 anos
A busca pela qualidade de vida a partir da maturidade se torna uma realidade, abrindo novos mercados no Brasil, país cujo número de idosos ultrapassou a faixa de 30 milhões em 2017, tendo crescido 18% em apenas cinco anos. “Se observamos a curva psicológica de felicidade no mundo, ela começa a descer a partir dos 20 anos, atinge seu pico mais crítico de infelicidade aos 45 anos e, a partir daí, a curva volta a subir, mostrando um aumento crescente na felicidade durante a maturidade”, lembra a autora.
Mesmo em países que apresentam grande desigualdade social, Avivah Wittenberg-Cox não acredita que a classe social seja um fator determinante nesta descoberta da felicidade na maturidade. “Dentro do processo de emancipação, decisivo na redescoberta de si mesmo durante a maturidade, existem mulheres de todas as classes sociais que hoje se tornam independentes porque elas não têm muita escolha. Mesmo se elas não são ricas, a independência financeira conquistada lhe ajuda a escapar do domínio de outros e essa é uma das etapas importantes do amadurecimento”, afirma.
Se em O Segundo Sexo, Simone de Beauvoir afirma que por volta dos 50 anos a mulher está em plena posse de suas forças, a intelectual feminista francesa sugere também, em A Velhice, que o destino clássico da mulher é ser um objeto erótico aos olhos do homem, e que, ao envelhecer, perde o lugar que lhe é destinado na sociedade contemporânea. Mas, segundo Avivah Wittenberg-Cox, “começamos a ver as primeiras gerações de mulheres que deixam seus maridos porque podem fazê-lo, isso é recente no mundo, não podemos esquecer este dado”, diz. “Mesmo nas classes sociais menos abastadas, verificamos o fenômeno de mulheres que se libertam depois que os filhos atingem uma certa independência”, relata a autora.
Wittenberg-Cox destaca a importância deste processo em terras brasileiras. “Não se trata apenas de uma pequena parte do tecido social. No Brasil, houve um aumento massivo da participação das mulheres na economia; estas mulheres poderão fazer uma escolha entre ficar ou partir, com parceiros que elas amem ou não. E isso é novo”, afirma. “A revolução feminina não é apenas econômica, mas emocional”, diz.
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As vantagens do amor na maturidade
“Acredito que, aos 30 anos, procuramos inconscientemente um(a) parceiro(a) para a primeira parte da vida adulta, que tem a ver com uma criação de si mesmo, de papeis, de família, de posição social”, analisa a autora. Depois dos 60 anos, Cox acredita que não importa se estas conquistas foram alcançadas ou não, mas o norte da bússola muda de direção. “Nos voltamos para questões mais profundas, para aqueles parceiros de quem seremos cúmplices e com quem teremos um verdadeiro prazer em passar o tempo”, detalha, dizendo que “às vezes pode ser o mesmo parceiro, que evolui conosco, às vezes não, mudamos de rota”.
Avivah lembra que, além da independência financeira, o autoconhecimento é muito importante. “É muito difícil amar alguém quando não nos amamos, e muitas vezes demoramos até a maturidade para encontrar esse amor por nós mesmos”, afirma. “A verdade é que começamos a envelhecer cada vez melhor, e durante mais tempo”, relata a autora que entrevistou casais heterossexuais e homossexuais durante a pesquisa para seu livro.
“Recolhi testemunhos apaixonados para o livro, vivendo plenamente todos os dias, mesmo com dor, ou problemas, foi mágico. Nunca é tarde demais”, afirma. “Não notei grandes diferenças entre casais gays ou heterossexuais do ponto de vista desta felicidade conjugal na maturidade. Algumas vezes entre os velhos homossexuais, eles podem ter sido heterossexuais durante um momento da sua vida, então a descoberta deste amor foi parte de uma descoberta de si mesmo. Gay ou hétero, é um pouco a mesma coisa quando nos descobrimos mais profundamente nestes amores tardios”, conclui a escritora.