“Atenção! Você chegou ao enclave de Frankfurt, situado no Sultanado de Baviera, na União Islâmica Europeia” – é assim que é saudado um dos protagonistas dos livros do célebre futurólogo e escritor de ficção científica russo, Vadim Panov.
Panov é o criador de vários mundos alternativos. Um dos mais conhecidos foi descrito na série ciberanarquista chamada “Enclaves”. Nessas obras se trata de territórios governados por corporações transnacionais que superam os governos em seu desenvolvimento e por isso existem de modo autônomo em um mundo onde ocorreu uma redistribuição maciça de zonas de influência.
Vale ressaltar que, tendo o primeiro livro da série sido lançado ainda em 2005, muitas das ideias que ele reflete já se tornaram ou estão prestes a se tornar uma realidade: a crise do conceito de multiculturalismo, a luta acirrada pelos recursos energéticos e o controle do ser humano através de dispositivos móveis.
Um correspondente da Sputnik Sérvia discutiu com o escritor russo ao que levará o processo de islamização da Europa e por que o iPhone é de fato uma tecnologia do século XIX.
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Projetos falhos
Vários anos atrás, a mídia falava muito sobre um tal projeto chamado Rossiya 2045 que previa a criação de uma réplica artificial do corpo humano, elaborado para uma futura transferência da consciência humana nos finais da vida de uma pessoa. Porém, o projeto logo se encontrou em um beco sem saída. A Sputnik perguntou a Panov se a ideia de reencarnação de fato pode ser aplicada também à consciência humana.
“Anteriormente, todos estavam animados com a clonagem, mas esse projeto também ficou esquecido. Por muitas razões. Uma delas consiste, precisamente, na impossibilidade de clonar completamente a consciência, o que era uma das exigências-chave do cliente”, observou o escritor.
De acordo com ele, as pessoas ricas “querem ter uma vida eterna”, ou pelo menos muito longa, e não representada nos filhos e netos.
“O desejo de viver se está tornando obsessivo: uns inserem em seus corpos corações alheios, outros buscam por pastilhas milagrosas feitas de células dos bebés, os terceiros querem que seu corpo seja congelado em resfriador criogênico. Eles esperam acordar em um mundo onde sejam imortais. Eles buscavam variantes — clonagem, cópias, mas elas não deram frutos. Por isso, eles decidiram se focar em pesquisas genéticas, engenharia molecular e tecnologias nano”, ressaltou.
A Sputnik também não perdeu a chance de debater com o autor russo a questão das tecnologias não tripuladas. Assim, o recente caso do acidente mortal com um carro não tripulado Uber repercutiu bastante na mídia, enquanto os construtores afirmam que a tecnologia não representa falhas em 95% dos casos.
Também é amplamente conhecido o acidente com uma arma antiaérea autônoma na África do Sul que matou 9 soldados no ano de 2007.
“Imaginem que um carro não tripulado transporta quatro pessoas. De repente, no seu caminho aparece um obstáculo, há colisão e os passageiros morrem, ou um passageiro, tanto faz. O importante é que morrem. Não há oportunidade para desacelerar, embora se possa contornar o obstáculo, mas lá tem pessoas, ou seja, pedestres, que este carro não tripulado matará ao contornar o obstáculo. A pergunta é a seguinte: o algoritmo vai escolher quem? Como ele vai agir em 95% dos casos? Quem vai ele salvar?”, se pergunta o autor.
“Em outras palavras, os robôs vão matar pessoas. E quanto mais robôs houver, mais matarão. Resta esperar que não comecem a gostar”, advertiu.
Inventos patéticos de hoje
Panov esconde sua opinião que ao longo dos últimos 100 anos não foram feitas nenhumas descobertas globais.
Ao mesmo tempo, o ex-presidente dos EUA, Barack Obama, chamava o fundador da Apple, Steve Jobs, de visionário. Porém, o autor russo afirma que a tecnologia “achada” pelo empresário está baseada em princípios já conhecidos havia muito.
“Existe o conceito de teoria científica, comprovada e em vigor. A teoria é uma ciência fundamental. É um bloco que serve para que os sucessores depois talhem seus achados. O iPhone explora a teoria do campo eletromagnético de James Maxwell, datada de 1864. […] A teoria científica mais recente hoje em dia é a quântica. Depois isso — nada”, exclamou o escritor russo.
Previsões e realidades
Em seus livros, Panov também descreve a chamada “Grande Fome de Petróleo”. Contudo, atualmente muitos especialistas estão mais preocupados com a escassez de água potável, pois segundo os dados cada sexta pessoa no planeta sofre dessa falta.
“É difícil dizer, pois com cada problema se lida tentando adiar sua chegada, mas isso é combater os sintomas. Entre os problemas mais próximos está a superpopulação. O planeta simplesmente não consegue lidar com as consequências da atividade humana, é um fato consumado. A escassez de petróleo, a escassez de água, o volume colossal de resíduos produzidos, que matam tanto a terra quanto o oceano, é uma realidade”, comentou Panov à Sputnik.
Voltando ao início desta matéria, perguntamos ao escritor também se o ambiente descrito na série “Enclaves”, isto é, o de corporações mais fortes que o Estado, já virou realidade. Na opinião do autor, esse processo ainda não está terminado, os governos continuam fortes, embora a desmontagem de Estados fracos já esteja em curso “como tentativa de eliminar os concorrentes”.
“Dividir para conquistar’ — esse lema deveria ser eterno. Durante o experimento ‘globalização’, a Metrópole [em sentido geral] começou a aniquilar os países, pois em um mundo unipolar pode existir apenas um Estado forte. De outra forma, como é que seria unipolar? Hoje em dia a situação mudou, surgiu o Movimento de Resistência à Globalização, mas o processo já começou e a reformatação dos pequenos países independentes em colônias semiformais continua”, opinou o futurólogo.
Ao falar sobre a chamada “al-Europa”, vale relembrar que o autor refletia sobre a futura islamização do continente ainda no início do século, muito antes da crise migratória que provocou grandes mudanças no panorama étnico da região. Panov revelou à Sputnik o que é que o fez pensar desse jeito.
“Que isso iria acontecer era claro para todos os que têm pelo menos algum conhecimento da Teoria da Evolução. As espécies fracas vão ser absorvidas pelas mais fortes. Se na família de Abdullah há seis filhos, e a única filha do seu vizinho parisiense é lésbica, adivinhem como será o rosto da capital francesa daqui a 40 anos. Isso não é bom nem é mau, é a Teoria da Evolução.”