A prática de usar regras “não escritas” vigora há anos na China, o que torna mais difícil a entrada de empresas estrangeiras no mercado do país. Com o desenvolvimento da guerra comercial entre Pequim e Washington, essas regras podem ser transformadas em arma, adverte uma equipe de reflexão.
O próximo passo de Pequim na retaliação contra as tarifas de Washington pode vir sob forma de regras não escritas aplicadas às empresas estadunidenses que operam na China, alerta o Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais (CSIS, sigla em inglês) em seu último relatório.
Segundo a equipe, Pequim adotou cerca de 300 padrões nacionais de segurança cibernética nos últimos anos. Esses padrões regulam o modo como as empresas, principalmente as envolvidas na produção de software e hardware, operam no mercado chinês. E apesar desses padrões serem considerados apenas como “recomendados”, o fato é que, se uma empresa estrangeira quiser trabalhar com empresas governamentais ou relacionadas com o governo na China, ela precisa atender a esses requisitos “não escritos”, esclarece o relatório.
Isso torna a entrada no mercado chinês um pouco mais complicada para todas as empresas estrangeiras, pois elas não apenas são forçadas a adaptar seus produtos, mas também precisam revelar dados confidenciais, esquemas e partes do código-fonte para passar a certificação. Embora não seja especialmente problemático para as empresas domésticas, as empresas estrangeiras não compartilharão voluntariamente dados confidenciais sobre seus produtos, ressaltou o CSIS.
O relatório observa que a formulação vaga nesses padrões permite que Pequim os manipule a fim de atrasar e negar a certificação para empresas norte-americanas, impedindo que novas empresas venham para a China e até mesmo forçando as que já têm um negócio bem-sucedido no país a sair. O CSIS afirma em seu relatório que esses padrões também podem se tornar uma moeda de barganha nas negociações entre Pequim e Washington.
Samm Sacks, um dos autores do relatório, disse em entrevista à CNBC que a China provavelmente usará sua “ferramenta invisível” como uma contramedida contra as tarifas dos EUA. No entanto, ele alertou que a prática pode ir além da guerra comercial, já que a tentativa do presidente chinês Xi Jinping de aumentar o poder de segurança cibernética do país é “muito maior do que a dinâmica com os EUA”.
As relações entre os EUA e a China despencaram depois que Washington impôs uma série de tarifas sobre produtos chineses, citando práticas comerciais desleais de Pequim que supostamente prejudicaram os saldos comerciais dos EUA.
Em 15 de junho, Trump anunciou que uma tarifa de 25% seria imposta sobre US$ 50 bilhões (R$ 195 bilhões) em produtos chineses. Mais tarde, em julho, os EUA introduziram mais taxas contra US$ 34 bilhões (R$ 132,6 bilhões) em importações chinesas. Recentemente, a Casa Branca prometeu impor tarifas adicionais de 25% sobre US$ 16 bilhões (R$ 62,4 bilhões) em produtos chineses a partir de 23 de agosto.
Pequim reagiu com medidas corajosas, como as tarifas sobre importações no valor de US$ 60 bilhões (R$ 234,1 bilhões) dos EUA, incluindo gás natural liquefeito (GNL) e aviões.