O ideia de “colapsologia” começou a se popularizar em 2015 com o lançamento do livro Comment tout peut s’effondrer (Como tudo pode desmoronar, em tradução livre), do engenheiro agrônomo Pablo Servigne e do pesquisador Raphaël Stevens. Na obra, que virou um best-seller na França, eles definem um novo objeto de pesquisa: o colapso do mundo. Baseados em estudos científicos multidisciplinares bastante pessimistas sobre questões climáticas, escassez energética e penúria de alimentos, eles alertam para um cenário preocupante.
Para os autores, o debate sobre o desenvolvimento sustentável estaria ultrapassado e o “colapso” do mundo já estaria em curso. Ao contrário de cientistas como o francês Jean Jouzel, especialista em questões climáticas, que dizem que a população tem pouco mais de dez anos para reagir, Servigne e Stevens defendem, de forma quase profética, que o fim da civilização industrial chegará mais rápido do que imaginamos, inclusive para as gerações atuais. A lógica tem motivado muitos jovens, conscientes de que já viverão esse contexto, a se manifestarem pela proteção do planeta.
Se preparando para esse fim “inevitável”, no ano passado os autores lançaram, junto com Gauthier Chapelle, o livro Une autre fin du monde est possible -Vivre l’effondrement et pas seulement y survivre (Um outro fim do mundo é possível. Viver o colapso em não apenas sobreviver a ele, em tradução livre). Trata-se de uma espécie de guia filosófico de como enfrentar o fim desse mundo tal qual conhecemos.
Teorias sobre extinção de Vikings e Maias inspiraram autores
Ambos os livros anunciam o fim dos recursos naturais e se baseiam em um modelo de ecologia radical, com menos dependência de produtos industrializados e tentativas de autonomia alimentar. Eles se inspiram, entre outros, nos trabalhos de Jared Diamond, autor do célebre Colapso – Como as sociedades escolhem o fracasso ou o sucesso, livro publicado em 2005 no Brasil. O intelectual americano, que ganhou o Pulitzer com Armas, germes e aço, parte do exemplo dos Vikings e dos Maias para mostrar como a exploração excessiva dos recursos naturais teria contribuído para a extinção desses povos. A tese de Diamond já foi contestada por vários cientistas. Mas isso não impediu que os autores franceses o usassem como referência e se reivindicassem criadores de uma ciência interdisciplinar.
Regada pelos debates sobre o aquecimento climático nos últimos anos, a “colapsologia” vem ganhando adeptos. Os vídeos de Pablo Servigne publicados na internet têm milhares de visualizações e o autor dá conferências em auditório lotados pelo país, além de conceder inúmeras entrevistas.
Com o objetivo de propagar suas ideias, ele também é um dos idealizadores de Yggdrasil, uma publicação trimestral que acaba de ser lançada na França. O nome vem da mitologia nórdica e poderia ser traduzido como “a árvore-mundo que conecta céu e terra, mortos e vivos”. Ecológica, impressa em papel reciclado, a revista terá apenas 12 edições e desaparecerá em seguida.
Associações à espera do colapso
Mas antes mesmo do lançamento do primeiro livro de Servigne e Stevens, algumas pessoas já se preparam para esse cenário catastrófico anunciado pelos autores. É o caso da associação francesa Adrastia, criada em 2014 e que tem mais de 400 membros. “O projeto nasceu da constatação da crise global que atravessamos. Essas crises, ecológica, energética e climática, não poderão ser resolvidas apenas com mais tecnologia”, explica Dominque Py, representante da Adrastia. “Nós avançamos rumo a um declínio ou a um colapso da civilização industrial, que não poderá mais assumir seu próprio funcionamento”, sentencia.
Ela concorda com as teorias de Servigne e Stevens e diz que é preciso se preparar para o momento em que a população mundial não terá mais agricultura ou eletricidade abundantes e baratas. “É preciso aprender a viver de maneira mais sobria e menos consumidora de energia, evitando situações de caos e tensão que vão surgir em razão dessas penúrias. Temos que nos organizar coletivamente para antecipar os choques que enfrentaremos nas próximas décadas”.
Tinder para quem não quer enfrentar o fim do mundo sozinho
Mas será que é possível ser “colapsologista” e otimista? “A tomada de consciência do colapso do mundo é mais uma questão de lucidez do que algo ligado ao fato de ser otimista ou pessimista”, insiste Dominique Py. “Independentemente de se ver o copo metade cheio ou metade vazio, o mais importante é tentar analisar a situação com lucidez e não se iludir”, finaliza.
Os “colapsologistas” já aceitaram esse preceito e há até quem busque seus semelhantes para não enfrentar o fim do mundo sozinho. Um grupo chegou a ser criado no Facebook para promover encontros entre os que seguem as teorias do desmoronamento da civilização industrial. Intitulada Adopte un colapso – Rencontrons nous avant la fim du monde (Adopte um colapsologista – Vamos nos encontrar antes do fim do mundo), a página funciona como uma espécie de Tinder para os desiludidos do planeta. Iniciada em tom de piada, ela reúne cerca de 3 mil membros e alguns casais já se formaram. Muitos se recusam a ter filhos e quase sempre se refugiam em zonas rurais, se preparando para o pior.