Entre prognósticos alarmantes e olhares otimistas, a reportagem ouviu cinco especialistas, de diferentes regiões do Brasil. Para eles, o futuro que nos espera está sendo plantado literalmente agora. 2038 pode ser de desertos ou de campos verdes, de chão rachado ou de nascentes permanentes.
Brasil, 2038. As imagens de torneiras e bocas secas, desertos imensos, conflitos por água povoam o imaginário de um futuro distópico, bem assustador para quem o considera como cenário possível. Como em filmes e seriados de TV em que grupos disputam à bala o poder de um poço profundo, 2038, também, marcará o centenário de Vidas Secas, obra de Graciliano Ramos que se inspirou na seca dos anos 1930 para contar uma história de ficção. Trata-se de uma família vagando pela caatinga em busca de sobrevivência. As lembranças daquele desastre (e de tantos outros, como o da seca de 1877) podem ficar no passado se, em um país que concentra nada menos do que 13% da água doce do mundo, a gestão de recursos hídricos se der de maneira adequada.
Neste sentido, entre as preocupações, figuram o crescimento desordenado das áreas urbanas, a falta de planejamento, a poluição e as alterações climáticas cada vez mais recorrentes. Porém, segundo especialistas ouvidos pela reportagem, há também muitas razões de otimismo diante das lições aprendidas, dos avanços sociais e da evolução das tecnologias.
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O coordenador do Instituto Virtual Internacional de Mudanças Globais (Ivig), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe-UFRJ), Marcos Freitas, lembra que no início do século 21, fez um prognóstico da crise hídrica pela qual passariam grandes centros urbanos nesta década. Ele, que é professor da pós-graduação e já foi diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), costuma propor uma reflexão para os alunos na disciplina de Vulnerabilidade Hidrológica: “A primeira coisa que eu faço com eles é mostrar que a água é um bem finito, embora seja renovável. Mas a população cresce”.
Com base nisso, entende que o cenário do semiárido tende a ser, curiosamente, de menor preocupação no futuro. “Do ponto de vista climático, as mudanças foram muito pequenas nesta região se recordarmos o que era o semiárido na década de 1930. São quatro meses de chuvas para oito meses de seca. Há de se considerar, ainda, o crescimento populacional no semiárido e mais pressão por recursos hídricos”, pondera. No entanto, alguns passos importantes foram dados. “No semiárido, só dois rios são perenes: São Francisco e o Parnaíba. Nesse passado, grande parte desse território não tinha água o suficiente, o que provocou o esforço migratório, que foi a solução da época”, lembra.
A situação começou a mudar, de acordo com o especialista, na década de 1960 com investimentos em infraestrutura, e a construção de barragens para guardar água, inclusive para construção de hidrelétricas. “Em 1938, seria muito difícil imaginar um avião levando frutas de altíssima qualidade de Petrolina (PE), em meio ao sertão, por exemplo, para o exterior. Hoje, trata-se de um sucesso consagrado nessa agricultura que aproveitou o clima mediterrâneo, com solos de boa qualidade e restrição hídrica”, aponta o professor. “A tecnologia foi melhorando e o desenvolvimento é bastante interessante. E isso era impossível para Graciliano Ramos prever”, complementa.
Marcos Freitas acrescenta que a região conhecida como “Matopiba” (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) já produz mais grãos do que o Sudeste. “A minha perspectiva para o Nordeste é mais positiva do que no Sudeste. O que não está sendo resolvida na velocidade adequada é a poluição das bacias da região”, alerta.