A Organização das Nações Unidas informou nesta sexta-feira (14) a previsão de mais de cinco milhões de migrantes e refugiados venezuelanos em todo o mundo até o final de 2019, devido a crise política e econômica no país. Os dados foram divulgados quando a ONU lança seu primeiro apelo por fundos para a região.
Lançado em Genebra, o Plano Regional de Assistência a Refugiados e Migrantes da Venezuela é o primeiro do tipo nas Américas, segundo comunicado conjunto do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e a Organização Internacional para as Migrações (OIM).
De acordo com as agências da ONU, cerca de três milhões de venezuelanos vivem atualmente no exterior, dos quais pelo menos 2,3 milhões deixaram a Venezuela desde 2015. A maioria deles se instalou na Colômbia e no Peru.
“Com base em números do governo, estima-se que haverá 5,3 milhões de refugiados e migrantes venezuelanos até o final de dezembro de 2019”, informou a ONU em seu Plano regional de intervenção.
Uma fuga de 5.500 pessoas por dia
Embora os venezuelanos estejam deixando o país há vários anos, esses movimentos populacionais aumentaram a partir de 2017 e os deslocamentos se aceleraram ainda mais em 2018, segundo a ONU. De acordo com as estimativas do ACNUR e da OIM, cerca de 5.500 pessoas deixaram o país a cada dia em 2018.
“Estamos enfrentando um terremoto humanitário”, disse o enviado especial da ONU para os refugiados e migrantes venezuelanos, Eduardo Stein, em entrevista coletiva.
“O pico” das partidas aconteceu “em meados de agosto, quando o número de venezuelanos que deixaram o país ultrapassou 18.000 por dia. Hoje, a soma caiu para menos de 5.000 por dia, em média”, acrescentou.
O pedido de fundos foi apresentado pela ONU com base no pressuposto de que a situação continuará difícil. As Nações Unidas pediram U$ 738 milhões (€ 654 milhões) para assistência a 16 países e um total de 2,7 milhões de pessoas (2,2 milhões de venezuelanos e 500.000 pessoas nas comunidades que os acolherão).
O êxodo de venezuelanos que fogem da situação econômica desastrosa em seu país é considerado como o maior deslocamento de pessoas na história recente da América Latina, segundo a ONU.
A Venezuela possui as maiores reservas de petróleo do mundo, mas está sufocada por uma profunda crise econômica e pelas sanções financeiras dos Estados Unidos.
Controle da mídia
A previsão do alto número de refugiados venezuelanos vem a público no mesmo dia em que circulou pela última vez em papel o jornal “El Nacional”. A falta de matéria-prima, a profunda crise econômica e as pressões políticas foram os motivos apontados para a decisão tomada pela direção desse veterano da imprensa latino-americana.
Após duas décadas de enfrentamentos com os governos de Hugo Chávez (1999-2013) e Nicolás Maduro, durante os quais dezenas de meios de comunicação desapareceram, as rotativas do “El Nacional”, nascido há 75 anos, vão parar.
“Eles conseguiram silenciar a rádio e a televisão e fazer desaparecer a imprensa escrita independente”, protesta Miguel Henrique Otero, o proprietário do jornal, em referência ao governo do presidente venezuelano que ele não hesita em qualificar de “ditador” em seus editoriais.
Contudo, o jornal anunciou que iria “impulsionar” o seu site. “Tornou-se impossível continuar a financiar o jornal em papel”, disse o editor Argenis Martinez, pouco antes de preparar a última edição desse tipo. “É uma sensação estranha”, completou.
Os problemas começaram em 2013, quando o governo criou uma empresa com o monopólio da importação e venda de papel-jornal. Segundo dados da ONG Espaço Público, que defende a liberdade de imprensa, mais da metade dos 134 jornais em circulação na Venezuela à época deixaram de ser impressos.
A mídia audiovisual não foi poupada. Em 2017, 52 estações de rádio e oito canais de televisão, incluindo a CNN em espanhol, pararam de retransmitir sua programação. “É uma grande dor, mas uma dor para a qual nos preparamos. Nós resistimos mais tempo do que esperávamos”, disse Hilda Lugo, editora de artes e entretenimento.
Uma luta perdida
Na tentativa de sobreviver, o “El Nacional” recebeu doações e até empréstimos de papel do grupo de imprensa “Diarios de América”, que inclui, entre outros títulos, o La Nación (Argentina), O Globo (Brasil) e El Mercurio ( Chile), explica Argenis Martinez. Entretanto, o diário não escapou da profunda crise econômica que aflige o país, mergulhada por cinco anos numa severa recessão e hiperinflação que deverá chegar a 10.000.000% em 2019, segundo o FMI.
O “El Nacional”, que contava com até 72 páginas e várias revistas, reduziu suas cópias para 16 páginas e limitou sua circulação a cinco dias por semana. A tiragem caiu para cerca de 5.000 cópias por dia, em comparação com as 250.000, em 2014, para as edições de fim-de-semana.
Em agosto, o governo de Nicolás Maduro decretou um aumento de 3.400% do salário mínimo, que encurralou muitas empresas. Vinte jornais dispensaram funcionários, reduziram sua oferta ou simplesmente fecharam. Em novembro, outro aumento de 150% foi decretado pelo líder socialista.
Jornalistas, por sua vez, denunciam agressões constantes e prisões ilegais. Só no primeiro semestre de 2018, o sindicato da categoria (SNTP) registrou 113 ataques contra repórteres.