O Centro de Ciência Social Histórica sobre Desigualdades Globais, novo polo de excelência inaugurado pela Universidade Federal Fluminense (UFF), será uma espécie de sucessor do ‘Fernand Braudel Center’, da Universidade de Nova Iorque que, depois de 40 anos, está encerrando suas atividades. A informação foi dada hoje (3) à Agência Brasil pelo professor da Faculdade de Direito Douglas Leite, um dos quatro coordenadores da nova unidade.
Os professores da UFF fazem parte de uma rede internacional de pesquisas, da mesma forma que ocorre com os pesquisadores do Centro Fernand Braudel. A orientação dessa rede foi que uma das universidades fosse escolhida pela sua tradição, pela orientação na área de historiografia e estudos de cena mundial, para receber o acervo do centro estrangeiro. A UFF foi a selecionada e vai se organizar como novo polo difusor dessa rede, que inclui universidades do mundo inteiro, em particular as situadas na periferia da cena mundial. “Estou falando da Turquia, da África do Sul, do Brasil”, disse Douglas Leite.
Como a UFF tem um programa de pós-graduação em história muito consolidado no exterior e no Brasil, e também na área de direito, o Centro de Ciência Social sobre Desigualdades Globais vai ser, inicialmente, um polo que receberá e procederá a instalação da biblioteca do ‘Fernand Braudel Center’ e se organizará a partir da criação de grupos de trabalho e linhas de pesquisa que seguem a mesma dinâmica do centro norte-americano.
Sistema mundo
O novo polo da UFF vai seguir uma tradição do ‘Fernand Braudel’ que é o estudo do que se chama Teoria do Sistema Mundo ou economia mundial. “É uma concepção teórica abrangente que concebe o estudo das desigualdades de maneira interligada”. De acordo com o professor, a chamada desigualdade de renda é só mais um aspecto de outras hierarquias e desigualdades que são, não só materialmente diversas, ou seja, que mostrem desigualdades de status, de gênero e raça, como também se reproduzem globalmente. “Não acontece isso somente no nível nacional, mas se articulam globalmente”.
O professor Leite explicou que a Teoria do Sistema Mundo é um modo de pensar a articulação das diferentes formas de desigualdade do ponto de vista teórico e também do ponto de vista espacial e temporal. Três dos quatro professores que coordenam o novo centro de ciência social têm experiência no estudo da escravidão moderna. “De saída, os estudos (do centro) se concentram no modo como as formas de divisão do trabalho na modernidade, e a escravidão é uma dessas formas, importam para as hierarquias que a gente vive ainda hoje”. Esclareceu que falar de escravidão não pode deixar de abordar a desigualdade de raça e de renda.
Tema comum
O centro vai funcionar como polo de pesquisa a partir de grupos de trabalho de diferentes lugares do mundo e com temas afins, que fazem com que essa pretensão que é articular ciência social, história, economia, geografia, letras, se debruce sobre um tema comum. Segundo Douglas Leite, são diferentes aspectos da desigualdade. Alguns projetos são verticalizados e têm estrutura empírica mais detalhada, enquanto outros são pensados em sua estrutura mais ampla, do ponto de vista global. “São diferentes linhas de pesquisa que absorvem grupos de trabalho articulados internacionalmente a partir de projetos”, definiu o professor.
O primeiro projeto do centro, que ocorrerá simultaneamente com a transferência do acervo do ‘Fernand Braudel’, foi elaborado pelo Instituto de História e obteve o primeiro lugar no edital de internacionalização da UFF de 2018. Ele reúne professores de vários cursos. “Essa é a plataforma de saída para estruturar o centro”.
A ideia é que o centro possa obter financiamento para reestruturar o espaço do Instituto de Ciências Humanas que abrigue o Centro de Ciência Social sobre Desigualdades Globais e também seja um espaço aberto para a universidade, para recepção de professores visitantes e alunos de pós-graduação de outros países. “Que seja um espaço de circulação internacional a partir do centro, que combine não só pesquisa, mas também ensino”. As reuniões entre pesquisadores poderão ocorrer presencialmente e também à distância. “Deve ser um espaço pensado para que outros professores e alunos se instalem aqui. É uma prática internacional”, reforçou Leite.
Encerramento
O primeiro maior evento envolverá o encerramento do ‘Fernand Braudel Center’ tanto em Nova Iorque como na UFF. Isso deverá ocorrer até metade de 2020, quando toda a biblioteca do centro americano, constituída por cerca de 20 mil títulos, deverá estar transferida para o Brasil. Douglas Leite disse que o centro da UFF tem, entre seus fundamentos, a possibilidade de produzir diálogo e pesquisa a partir de espaços exteriores à universidade, de modo a englobar também atores de movimentos sociais, formuladores de políticas públicas e centros empresariais, “sem nenhum preconceito”.
Leite afirmou que como o centro parte de pesquisas já iniciadas e, ao mesmo tempo, do grande projeto de internacionalização, “a rigor, ele já tem trabalho”. Esclareceu que o desenvolvimento do novo polo, com o número de grupos de trabalho e de linhas de pesquisa definidos, será construído a partir de agora, após seu lançamento, registrado na última sexta-feira (31).
Durante o evento que marcou o lançamento do centro da UFF, o diretor adjunto do ‘Fernand Braudel Center’, Dale Tomich, declarou que a escolha da universidade herdeira do acervo não foi aleatória. Para ele, “a UFF é o lugar ideal para um centro de pesquisa que visa gerar discussões sobre esses temas”.
Integram a coordenação do Centro de Ciência Social sobre Desigualdades Globais da UFF os professores Leonardo Marques e Tâmis Parron, do Instituto de História, e Rogério Dultra, da Faculdade de Direito.