A venda direta de etanol, dos produtores aos postos de combustíveis, pode ser permitida em breve e levantou mais uma discussão sobre o setor de combustíveis. O Senado aprovou ontem (19) o Projeto de Decreto Legislativo 61/2018 que trata da medida. Agora, o texto será encaminhado para votação na Câmara dos Deputados.
Atualmente, essa venda direta é proibida pela Resolução nº 43, de 2009, da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). Apenas distribuidores autorizados e fornecedores cadastrados na agência podem comercializar etanol combustível. O projeto modifica esse artigo e permite a venda direta.
Segundo a proposta, o objetivo é aumentar a concorrência no mercado de combustíveis e, assim, baixar o preço para o consumidor.
A medida é defendida pela Federação dos Plantadores de Cana do Brasil (Feplana), que representa produtores e fornecedores independentes de cana-de-açucar em 13 estados. Para a federação, a venda direta melhora a formação de preços ao consumidor, já que exclui as margens de lucro das distribuidoras.
Possibilidade de negócio
Além disso, para a Feplana, não seria uma obrigatoriedade, mas uma possibilidade de negócio a mais para os produtores avaliarem.
“Temos que modernizar a comercialização do etanol, não pode ser como se comercializa a gasolina. São poucas destilarias de gasolina, então comercializar por meio de distribuidoras facilita a logística e distribuição. No caso do etanol, temos 400 unidades industriais pelo país e ele pode ser vendido regionalmente”, disse o diretor da Feplana, José Ricardo Severo.
Para ele, a venda direta de etanol pode, inclusive, pressionar para uma redução nos preços da gasolina, por exemplo, ao dificultar a formação de cartéis.
Em meio a paralisação de caminhoneiros autônomos, no último mês, que afetou o abastecimento em várias partes do país, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) divulgou um estudo com nove propostas para aumentar a concorrência no setor de combustíveis como forma de reduzir os preços ao consumidor. Uma das sugestões é permitir que produtores de álcool vendam diretamente aos postos.
Para o Cade, este tipo de norma regulatória da ANP, a princípio, produz ineficiências econômicas, à medida em que impede o livre comércio e dificulta a possibilidade de concorrência que poderia existir entre produtor de etanol e distribuidor de combustível.
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Contrários à venda direta
Em nota, a Plural, associação de distribuidores de combustíveis, afirmou que o projeto aprovado ontem no Senado não leva em conta as complexidades que envolvem o setor.
“Na realidade, o preço final ficará mais caro, a garantia de qualidade mais difícil e a arrecadação por parte do estado mais vulnerável. Não à toa, além da Plural, as outras duas principais entidades que representam o setor de etanol são contra a proposta: a Unica [União da Indústria de Cana-de-Açúcar], dos produtores, e a Fecombustíveis [Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes], dos postos revendedores”, diz a nota.
Para a entidade, as usinas produtoras não possuem logística necessária, que envolve sistemas de dutos, ferrovias e bitrens, para chegar aos mais de 40 mil postos espalhados pelo Brasil.
“A complexa malha em funcionamento atualmente só foi possível ao longo de anos de investimento e desenvolvimento sob uma sólida regulação que define claramente os papéis e responsabilidades de cada agente da cadeia de suprimentos”, acrescenta.
A Unica também é contra a comercialização direta de etanol combustível pelos produtores aos postos porque vai dificultar a implementação da Política Nacional de Biocombustíveis, o RenovaBio.
Essa política reconhece o papel dos biocombustíveis na matriz energética brasileira, tanto para a segurança energética quanto para mitigação de redução de emissões de gases causadores do efeito estufa.
“As distribuidoras são parte estratégica dessa política, pois terão que cumprir as metas de descarbonização por meio da compra e venda de Cbios (certificado de redução de emissões de carbono). Isso faz com que os renováveis aumentem sua participação na matriz de combustíveis no longo prazo, permitindo a melhoria contínua da qualidade do ar nas grandes metrópoles”, disse a Unica, em nota.
Estrutura tributária
Para a entidade, para autorizar a venda direta será necessário mudar também a estrutura tributária do setor, já que os tributos federais incidentes sobre o etanol hidratado são recolhidos pelo produtor (R$ 0,13 por litro) e pelo distribuidor (R$ 0,11 por litro).
A ausência do distribuidor exigiria que a cobrança seja concentrada no produtor ou nos próprios revendedores.
Além disso, segundo a Unica, não é proibida ao produtor a venda ao varejo, já que a atual legislação permite aos fornecedores abrirem suas próprias distribuidoras.
A reportagem da Agência Brasil entrou em contato com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis e a Fecombustíveis para repercutir a aprovação do projeto no Senado, mas não obteve retorno.