Era seu primeiro atendimento na Vila Madalena. Lotado na Lapa, até então os chamados tinham se resumido ao atendimento a velhos senhores e amáveis senhoras vítimas de quedas ou de problemas cardíacos e respiratórias.
Saiu com a sirene ligada. Talvez nem precisasse. Alcançou a Pedroso, entrou por ruas bem tranquilas do bairro. Não gastou mais do que sete minutos. Parou em frente ao número, achou estranho, pensou ser um trote. Estranhou, sim, a ausência da vizinhança tão comum nas emergências da Lapa. No antigo bairro, os longos anos de convivência entre as famílias haviam formado um exército de solidários, que precavidos, já tratavam de reservar espaçosa vaga, para a viatura estacionar. De longe, já se via gente batendo os braços, sinalizando o local exato da ocorrência. Sempre prontos para prestar “socorro” aos socorristas, ofereciam-se para tomar conta da ambulância, ajudavam a carregar macas, perguntavam sobre o estado do paciente e para qual hospital seria levado. Na saída, abriam caminho, parando o trânsito. Agradeciam, elogiavam.
Na Vila, porém, nenhuma alma viva. Olhou o celular. Quatro e vinte da tarde. Estava com a impressão de ser bem mais tarde, de tão agitada estava aquela segunda-feira. Os atendimentos da manhã já formavam um quebra-cabeças na memória.
Pegou as anotações. Conferiu o chamado. “Segundo eco Terceiro” …. Coçou a cabeça…. Costumavam ser bem complicados.
Um senhor atendeu a campainha. Muito aflito, enquanto atravessava corredores, salas, salões, guiando a equipe, lamentava o ocorrido.
Chegaram no quarto onde um jovem estava estirado no sofá.
Assim que examinado, os dados foram anotados, transmitidos e a remoção autorizada. Na última Intoxicação Etílica, a pouco menos de um mês, o rapaz havia estado em coma. No exame, alguns sinais de alerta foram percebidos.
Voltou até à ambulância, para pegar a maca. Custou a acertar o caminho, tão grande era a casa.
Não havia imaginado o socorro aos ricos. Pensava que todos eles, em suas emergências, fossem socorridos por seus planos de saúde, em veículos confortáveis e equipados ou por helicópteros e UTI’s aéreas. Ainda bem que mantinha a ambulância sempre limpinha e com o check-list em dia. Assim, não ficaria envergonhado.
Posicionou a maca ao lado do sofá. Estendeu os braços para oferecer auxílio. O jovem, ergueu-se um pouco e com um aperto mole da mão, disse: – Muito prazer e muito obrigado… Podem ir! Vocês devem estar muito ocupados!
Insistiram na remoção. Não teve jeito.
Atordoado, com olhos lacrimejantes, o pai assinou o Termo de Recusa.
Enquanto a equipe voltava para a ambulância, carregando equipamentos e maca, outro chamado no rádio.
(7X7 é uma série ficcional, baseada em fatos vivenciados por um socorrista em São Paulo). Terceiro episódio.