O vírus Zika é um dos mais temidos do mundo, pois pode causar graves danos ao cérebro de bebês e adultos.
Mas como um vírus tão pequeno e simples pode fazer tanto mal? Um novo estudo publicado na revista PLOS Pathogens revela os segredos da maquinaria do Zika e aponta uma possível vulnerabilidade que poderia ser explorada para desenvolver um tratamento.
O Zika pertence a uma família de vírus chamados flavivírus, que incluem outros patógenos mortais como o vírus do Nilo Ocidental, da dengue, da febre amarela e da encefalite japonesa. Esses vírus são transmitidos por mosquitos e podem infectar vários tipos de células humanas, especialmente as do sistema nervoso. O Zika é particularmente perigoso para mulheres grávidas, pois pode atravessar a placenta e afetar o desenvolvimento do cérebro do feto, causando microcefalia e outras malformações congênitas. Além disso, o Zika também está associado a doenças neurológicas em adultos e crianças, como a síndrome de Guillain-Barré, que causa fraqueza muscular e paralisia.
Os vírus são parasitas que dependem das células hospedeiras para se reproduzir. Eles invadem as células e usam seu material genético e suas máquinas moleculares para produzir mais cópias de si mesmos. Mas os vírus têm um problema: eles têm um material genético muito limitado, que só codifica algumas proteínas. Por isso, eles precisam que essas proteínas sejam muito versáteis e eficientes.
O Zika é um exemplo disso. Ele só produz 10 proteínas, mas uma delas é uma enzima multifuncional chamada NS2B-NS3, que tem duas funções essenciais para a replicação viral: quebrar proteínas (protease) e dividir seu próprio RNA de fita dupla em fitas simples (helicase). A protease é responsável por cortar as proteínas que o vírus produz em pedaços menores, que serão usados para montar novas partículas virais. A helicase é responsável por separar as duas fitas do RNA do vírus, que contém as instruções para produzir mais proteínas.
Mas como uma única enzima pode realizar duas funções tão diferentes? É aí que entra a mudança de forma. Os pesquisadores do Sanford Burnham Prebys, um instituto de pesquisa biomédica nos Estados Unidos, mostraram que a enzima do Zika muda de função dependendo de como está moldada. Quando está na conformação fechada, ela atua como uma protease clássica, quebrando as proteínas. Mas depois ela oscila entre as conformações aberta e superaberta, que permitem que ela agarre e solte uma fita de RNA, realizando a função de helicase. Essas mudanças de forma são essenciais para que o vírus consiga se replicar dentro das células.
Essa descoberta pode ter um grande benefício: um alvo terapêutico. Se os cientistas conseguirem bloquear as mudanças de forma da enzima do Zika, eles poderiam impedir que ela realizasse suas funções vitais e, assim, parar a replicação do vírus. Isso poderia levar ao desenvolvimento de uma droga específica para tratar a infecção ou a doença pelo vírus Zika, que atualmente não existe. As pessoas infectadas pelo Zika só podem tratar os sintomas, como febre, dor nas articulações ou erupção cutânea, com medicamentos comuns, como antipiréticos ou analgésicos. Também não há vacina disponível para prevenir a infecção pelo Zika. A melhor forma de prevenção é evitar a exposição ao vírus e proteger-se das picadas de mosquito.
O estudo dos pesquisadores do Sanford Burnham Prebys é um passo importante para entender melhor o Zika no nível molecular e buscar novas formas de combatê-lo. Eles esperam que seus achados possam contribuir para o desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas contra o Zika e outros flavivírus, que representam uma ameaça global à saúde pública.