Enquanto evidências robustas validam a oxigenoterapia hiperbárica em condições críticas, a expansão para tratamentos de rejuvenescimento e perda de peso – impulsionada por relatos anedóticos e divulgação irresponsável por médicos e influenciadores – gera controvérsias que colocam a segurança dos pacientes em risco.
A oxigenoterapia hiperbárica (OHB) tem se destacado na medicina por sua eficácia comprovada no tratamento de condições como a doença descompressiva, queimaduras graves, anemia severa e infecções ósseas e cutâneas. Em câmaras homologadas, onde o paciente inala 100% de oxigênio com pressões controladas entre 1,5 e 3,0 ATA, as evidências científicas demonstram resultados consistentes na regeneração dos tecidos e na aceleração dos processos de cura.
Porém, a técnica vem sendo testada de forma “off-label” em outras áreas, como lesões cerebrais traumáticas, COVID longa, fibromialgia e iniciativas voltadas à “reversão do envelhecimento” e emagrecimento. Embora estudos iniciais apresentem resultados promissores, eles ainda são limitados por amostras pequenas e metodologias que carecem de maior rigor, além da ausência de apoio financeiro decorrente da impossibilidade de patenteamento da tecnologia.
A ANVISA, órgão regulador brasileiro, enfatiza que a OHB deve ser realizada exclusivamente com dispositivos homologados e em ambientes controlados, como clínicas e hospitais, onde a segurança e a eficácia do tratamento são rigorosamente garantidas. O uso dos equipamentos deve se restringir às indicações terapêuticas respaldadas por evidências científicas, enquanto dispositivos não regulamentados – como as câmaras domésticas de “mild hyperbarics”, que operam com ar comum a 1,3 ATA – podem comprometer tanto os resultados do tratamento quanto a segurança dos pacientes.
Um dos obstáculos para ampliar as indicações da oxigenoterapia hiperbárica (OHB) é a ausência de um “driver comercial”. Diferentemente dos medicamentos patenteáveis, os protocolos da OHB não contam com o suporte financeiro habitual da indústria farmacêutica, o que leva os pesquisadores a dependerem de estudos independentes e do apoio de movimentos que defendem os direitos dos pacientes. Além disso, muitas das defesas desse tratamento se baseiam em relatos de caso – ou seja, descrições anedóticas de resultados em pacientes – que, por si só, não oferecem comprovação científica robusta da eficácia terapêutica. Sem o suporte financeiro de grandes empresas, as pesquisas sobre novas aplicações ficam restritas a estudos com recursos limitados, o que atrasa o avanço e a validação de usos promissores, comprometendo a ampliação segura e fundamentada do tratamento para além das indicações atualmente aprovadas.
Efeitos Colaterais e Riscos
As câmaras hiperbáricas, que operam com 100% de oxigênio e sob altas pressões, demonstram resultados comprovados em alguns tratamentos, em contraste com os dispositivos caseiros, que não alcançam os protocolos terapêuticos ideais e apresentam riscos, como contaminação e acúmulo de dióxido de carbono. Essa diferença foi ressaltada por especialistas como o Dr. Shai Efrati, diretor do Sagol Center for Hyperbaric Medicine and Research e professor associado na Universidade de Tel Aviv, que afirmou em entrevista ao Fortune Well que “a eficácia da OHB depende tanto da pressão quanto da concentração de oxigênio.”
Durante as sessões, as variações de pressão podem causar efeitos colaterais como dores nos ouvidos e seios nasais, lesões no ouvido médio e alterações temporárias na visão. Em casos raríssimos, a alta pressão pode resultar em colapso pulmonar ou em falhas catastróficas dos equipamentos, como explosões – uma delas, ocorrida nos EUA no início deste ano, resultou na morte de um menino de 5 anos – o que ressalta a importância de um monitoramento rigoroso e do uso exclusivo de dispositivos homologados para garantir a segurança do paciente.
Apesar das bases sólidas para seu uso em indicações específicas, a expansão da oxigenoterapia hiperbárica (OHB) para outras finalidades, como o retardamento do envelhecimento e a perda de peso, permanece controversa. Popularizado por celebridades em busca de tratamentos anti-envelhecimento, o fenômeno carece de evidências robustas. Estudos isolados, como o de 2020, sugerem que a terapia poderia aumentar o tamanho dos telômeros—estrutura protetora localizada nas extremidades dos cromossomos que tende a reduzir-se com a idade—e diminuir a senescência celular. Contudo, essas investigações enfrentam limitações significativas, como amostras reduzidas e metodologias questionáveis. Uma revisão sistemática de 2022 concluiu que, embora existam indícios iniciais, não há pesquisas suficientes para comprovar os benefícios da OHB contra o envelhecimento, especialmente se considerado o paradoxo do oxigênio, no qual tanto sua deficiência quanto o excesso podem estimular a formação de radicais livres, acelerando, assim, o processo de envelhecimento.
Diante desse cenário, apoiar os supostos benefícios da oxigenoterapia hiperbárica apenas em relatos de caso, uso off-label e estudos de pequena escala revela-se extremamente arriscado. A disseminação de informações não comprovadas, especialmente por médicos e influenciadores nas redes sociais, sem uma fiscalização adequada, pode induzir o público a adotar tratamentos baseados em expectativas infundadas e evidências frágeis. Sem a devida validação científica, a promoção desses tratamentos pode comprometer a segurança dos pacientes, causando danos e retardando o avanço de práticas terapêuticas comprovadas. Portanto, é imperativo que a divulgação dos benefícios da OHB seja embasada em pesquisas rigorosas e que os órgãos reguladores intensifiquem a fiscalização, prevenindo a disseminação de informações que possam colocar a saúde dos pacientes em risco.