Muitos indicam: as eleições brasileiras deste outubro podem ser as mais imprevisíveis da história. Com Lula encarcerado e o perigo de “radicalismo” pendente, o panorama político parece não ter nenhum candidato vigente. A Sputnik Brasil discutiu com uma especialista sobre que riscos tal situação poderia acarretar.
De acordo com a brasilianista e especialista em assuntos latino-americanos, professora titular da Universidade de Relações Internacionais de Moscou (MGIMO), Lyudmila Okuneva, uma das maiores preocupações da grande parte dos brasileiros hoje em dia é a existência de “dois radicalismos”, um de esquerda e outro de direita. O primeiro costuma ser associado com a pré-candidatura (mesmo juridicamente impossível) de Lula e o outro — com o ranking cada vez maior do deputado Jair Bolsonaro.
“Entretanto, não chamaria Lula de radical. Em alguns casos na sua carreira política anterior, Lula nem se identificava como de esquerda, pois é um moderador, negociador e mediador muito bom, é a postura dele, mas claro que se escolhermos entre, digamos, Temer e Lula, o último é visto como esquerdista”, observa a cientista política.
Ao relembrar as atitudes tensas dos brasileiros em relação à intervenção federal no Rio de Janeiro, no início deste ano, com a aplicação do respectivo artigo constitucional pela primeira vez na época da democracia brasileira desde o ano 1985, a analista frisa que a “memória” do poder dos militares continua forte na mente dos brasileiros.
“Eles têm medo de Bolsonaro. Pois a ‘injeção’ de regime militar foi mais que forte após os militares terem passado 21 anos no poder”, diz.
O principal problema das eleições, diz Lyudmila Okuneva, é que por enquanto não existe um candidato único do centro. Este “centro” até hoje não conseguiu se unir para lançar uma candidatura forte e consolidada.
Ao mesmo tempo, o número de apoiadores de Bolsonaro não está reduzindo, chegando a cerca de 15% de acordo com várias pesquisas, o que mostra que um certo segmento da população apoia medidas mais radicais no governo do país.
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“Por um lado, há essa ‘injeção’ contra os militares. Por outro, há um crescimento da intenção de voto em Bolsonaro e, o que é ainda mais importante, há toda essa bagunça e problemas sociais que não se resolvem, a classe política está toda corrupta… Isto é um solo muito propício para os militares. Pois quando tem corrupção, os militares dizem: ‘Vamos pôr ordem’, ‘Vamos limpar tudo’. Falavam o mesmo na época da ditadura”, adverte a especialista.
Contudo, a analista não acredita que os militares na verdade possam chegar ao poder no Brasil contemporâneo, sendo que existe uma Constituição, aprovada com referência a este perigo.
“Alguém poderia imaginar que os militares possam realizar um golpe, porque não chegarão ao poder de modo legítimo […] Mas, em minha opinião, isso não acontecerá de modo algum, os militares modernos são de outro tipo. Já foram criados com a noção que os militares não podem efetuar golpes desses, são instruídos de modo diferente. Não acho que isso possa acontecer pela segunda vez”, conclui a investigadora.