Recentemente, o estudo “COPCOV” publicado na PLOS Medicine trouxe a hidroxicloroquina de volta ao debate sobre a COVID-19. Embora algumas interpretações tenham sugerido que a pesquisa comprovaria a eficácia do medicamento, uma análise cuidadosa revela que não é bem assim.
O estudo analisou a eficácia da hidroxicloroquina na prevenção de complicações causadas pela COVID-19, comparando-a com um placebo. Para isso, os pesquisadores criaram gráficos que mostravam a incidência de doenças respiratórias entre os que tomaram o medicamento e aqueles que receberam placebo.
Um ponto problemático surgiu com um dos gráficos: ele exagerou visualmente a diferença entre os dois grupos ao ajustar a escala vertical (o eixo Y) para que fosse de 0% a 5%. Isso pode criar a ilusão de uma diferença significativa, quando na verdade o impacto foi mínimo. Quando usamos uma escala mais ampla, que vai de 0% a 100%, a diferença praticamente desaparece. Esse tipo de ajuste gráfico é como usar uma lupa: pequenos detalhes são ampliados e podem distorcer a realidade.
O gráfico acima ilustra a comparação da incidência de doenças respiratórias entre os grupos que tomaram hidroxicloroquina e placebo, com base no estudo COPCOV.
- Escala de 0% a 5% (à esquerda): Destaca uma aparente diferença maior entre os grupos, já que a escala vertical é ajustada para valores baixos, exagerando visualmente a disparidade.
- Escala de 0% a 100% (à direita): Mostra os mesmos dados, mas em uma escala completa, de 0% a 100%. Aqui, a diferença entre os grupos parece quase insignificante, destacando como ajustes gráficos podem influenciar a percepção dos resultados.
Para decidir se um medicamento funciona, cientistas usam uma medida estatística chamada “valor de p”. Em geral, se o valor de p for menor que 0,05 (ou 5%), é considerado que há uma diferença real entre os grupos. No caso do estudo COPCOV, o valor de p foi de 5,1%, quase atingindo o limite de 5%, mas não o suficiente para ser considerado estatisticamente significativo.
Isso significa que, pelos critérios científicos, os dados não provam que a hidroxicloroquina teve um efeito relevante na prevenção da COVID-19.
Problemas Metodológicos e Dados Limitados
O estudo usou um método estatístico que não é ideal para grandes amostras, como o “teste exato de Fisher”. Além disso, a maioria dos participantes tinha menos de 40 anos, e apenas um pequeno número era idoso, limitando a relevância dos dados para grupos de maior risco.
Mesmo com esses dados, a hidroxicloroquina mostrou uma redução de risco de apenas 1,9%. Isso significa que seriam necessárias 53 pessoas usando o medicamento para evitar um único caso sintomático de COVID-19. E, mais importante, o estudo não encontrou benefícios claros em termos de gravidade da doença, hospitalizações ou mortes.
Erros na Análise dos Dados
Os autores também realizaram uma meta-análise, combinando resultados de outros estudos. No entanto, foram encontrados erros nos cálculos, o que compromete a confiança nos resultados apresentados. Isso reforça que as conclusões sobre a eficácia da hidroxicloroquina precisam ser tratadas com cautela.
Mesmo desconsiderando os problemas metodológicos, o impacto da hidroxicloroquina foi pequeno. Ela não demonstrou reduzir a gravidade da doença ou prevenir complicações sérias, que são os critérios mais importantes para um tratamento eficaz.
O estudo COPCOV não confirmou a eficácia da hidroxicloroquina como prevenção da COVID-19. Apesar da atenção que recebeu, problemas nos dados e falta de benefícios consistentes deixam claro que não se trata de uma “redenção” do medicamento.
Fontes: Link, Link 2, Link 3, Link 4.